ArtigosJ.R. Guedes de Oliveira

“Pica-pau” e seu elenco

A Casa da Lavoura, em Capivari, SP, ficava na rua Padre Fabiano, quase que no cruzamento com a rua Barão do Rio Branco. Isto nos idos de 60. Lá, os pequenos agricultores tinham repostas às suas consultas e sementes para o plantio em sua gleba de terra.

Comandava esta unidade do CATI ou Secretaria Estadual de Agricultura, o Engenheiro Agrônomo “Seu Ageu” (não me recordo o seu sobrenome), mais conhecido por “Pica-pau”. Conheci-o, pois era meu vizinho, ou seja, ele morando na rua Sinharinha Frota e, eu, na referida rua Padre Fabiano, nas imediações do Pátio da Santa Cruz. Bom de conversa e amizade das boas, mesmo eu sendo jovem na época.

Homem sumamente ligado ao teatro, em suas horas soltas. Tinha um verdadeiro elenco, dos melhores que Capivari já viu, inclusive contando com a talentosa figura de José Cabrera, um artista nato. Dos melhores. Filha e genro do “Pica-pau” também faziam parte desse grupo de teatro, que tinha como título Grêmio de Cultura Artística “Rodrigues de Abreu”.

Depois do retumbante sucesso da apresentação do drama “Amor Louco”, no palco do Clube União 28 de Setembro, existente então na praça 13 de Maio, resolveram dar um passo maior e uma apresentação nas dependências do Cine Vera Cruz, em noite de gala. Seria a coroação de todo trabalho realizado em prol da cultura teatral em Capivari.

O Cine Vera Cruz lotado. Uma expectativa enorme por parte de todos para assistirem a apresentação de artistas memoráveis da cidade. A peça referida, seria a mesma, ou seja, “Amor Louco”.

Pois, bem. Num momento da encenação, o marido (encenado por Cabrera) entra em casa e apanha a sua mulher (encenada pela filha do Pica-pau), com um outro homem (o genro do Pica-pau). E, diante desse flagrante, resolve matá-lo, com alguns tiros à queima roupa. Contudo, ocorreu que a espoleta do revólver na dispara e insiste o ator Cabrera no seu intento. Fácil é supor que a imensa plateia do Cine Vera Cruz, cuja lotação passava de 1200 pessoas, numa gritaria geral e risos por todos os cantos, pelo que estava ocorrendo. Nesse exato momento, o ator José Cabrera, com toda a sua naturalidade de artista nato, disse:

– Já que o meu revólver falha, vou lhe dar algumas coronhadas.

E assim, ele faz, desferindo tal arma na cabeça do traidor (o genro do Pica-pau). E a cortina fecha, com um corre-corre sem tamanho, levando o tal à Santa Casa de Misericórdia de Capivari para o devido cuidado de alguns pontos na cabeça. Foi bem original na peça.

Quem esteve lá e presenciou a cena, jamais esqueceu da cena em que o Cabrera realmente foi além de um artista: não representou, mas foi fiel às vias de fato. Assim, o aplauso foi geral e todos em pé ante o inusitado acontecimento. Só mesmo sobrou para o “Pica-pau” e seus artistas correrem atrás de médicos.

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