Os dois já sem vida e todos despedaçados
Não me contive
Comecei a chorar e a gritar sem ninguém para ajudar
E o que mais ia adiantar?
Gritei a Papito:
“Onde você está?”
Somente a chorar
Então avistei num canto uma escada estreita e quebrada
Até onde estava o menino não tinha como chegar
Um forro de madeira devia ser para alguma coisa guardar
Assobiei pro meu cavalo, que foi ligeiro pra entrar
Subi no seu lombo, fiquei em pé e o menininho, coitado
Encolhidinho com as mãos no joelho a soluçar
Tirei o lenço do meu pescoço e seu rostinho comecei a enxugar
Veio num desespero me abraçar
Desfaleceu nos meus braços
Saímos pra fora para respirar
Molhei seu rostinho e fui chamando até acordar
Nisso, um barulho de carroça
Só sei que aqueles três homens vieram ajudar
Um deles, seu João, pediu meu cavalo emprestado e pegou a criança
E a galope saiu dizendo que eu já não estava em condição de continuar
Seu Zé subiu na carroça e foi na vila para o delegado avisar
Tião sabido era o seu apelido, ficou comigo
Já foi me acalmando e começou na casa entrar
Entrei com ele, que foi dizendo:
“A onça esteve por aqui”
“É a mesma que já fez estrago com as criações deste lugar”
“Mas num é que eu vô atrás e agora procurar”
E saiu, me deixando aqui neste lugar
Olha, seu moço, o que aconteceu aqui foi feio
Bem pior do que eu acabei de te contar
Já faz 20 anos
O Papito, o padre encontrou uma família que quis adotar
Depois não tive mais notícias
Do fato ninguém mais queria falar
Olhei pro moço, que ficou ouvindo tudo sem nada me perguntar
Olhando bem pra ele, vi duas lágrimas a rolar
Do seu nome de novo tornei a perguntar
Ele me disse:
“Agora um causo também vou te contar”
Continua na próxima semana.