16/03/2018
O São Paulo está doente
Mais uma vez, o São Paulo demitiu um treinador. Mais um ano começa e o time perdeu alguns jogadores e contratou outros. Mais uma vez a perspectiva de títulos é diminuta. Tudo isso tem relação. Lei da causa e efeito. Ou da semeadura, para os mais religiosos: colhemos o que plantamos.
A troca constante de técnicos faz com que não existam conquistas, porque futebol é sequência, conjunto e entendimento de uma serie de comportamentos e princípios e sub-princípios de ataque, defesa e transições. Mas vamos voltar o nosso olhar para algo mais amplo e complexo. Toda essa falta de norte emerge da bagunça política e administrativa que o São Paulo Futebol Clube atravessa há uns bons anos. Desde o terceiro mandato de Juvenal Juvêncio, passando pela renúncia de Carlos Miguel Aidar e culminando agora com Leco.
Tenho a plena convicção que o resultado dentro de campo é reflexo de tudo o que acontece nas relações entre todos os setores do clube. Do porteiro ao presidente, passando pelos jogadores e pelo técnico. Todos tem a sua parcela nas conquistas e nos fracassos. Uma má administração dificultará muito o processo de formação de uma equipe vencedora.
O São Paulo ganhou um título nos últimos dez anos. Inúmeros treinadores passaram pelo clube nesse tempo e nenhum teve sucesso. Claro que podemos apontar falhas em cada um dos profissionais que estiveram liderando o trabalho de campo. Porém não é possível afirmar que eles são os problemas e que o clube é que é a vítima. Há algo errado na estrutura, no arcaico jeito de fazer e planejar. O que funcionava há dez anos hoje já ficou superado.
Com a atual visão de futebol dos seus cardeais, o Tricolor só será o primeiro dentre os grandes na letra de seu hino.
A complexidade do resultado no futebol
Palpitar, dar prognósticos, apontar favoritos, cravar placares é algo que está enraizado na cultura do futebol. Crescemos aprendendo a defender com unhas e dentes nossas convicções. E aqui no Brasil, particularmente, temos um viés muito individualista para analisar o jogo. Há no inconsciente da opinião pública uma imagem soberana de que contratando os melhores jogadores teremos o melhor time. É claro que contar com atletas de grande qualidade técnica ajuda a se aproximar das vitórias. Mas muitas vezes não será esse o fator mais decisivo.
O resultado dentro de campo de um time é produto de tudo que acontece em torno dele. Funcionando como um motor, cada peça tem a sua função. E para o todo funcionar bem as partes tem que estar não só atuando no seu máximo como também em sintonia com o propósito maior do clube.
Por exemplo, se o departamento médico de uma equipe não estiver funcionando bem e as lesões não forem bem diagnosticadas e tratadas o resultado em campo pode não ser tão bom. Se o departamento de nutrição não estiver em sintonia com o que a comissão técnica tiver em mente podem aparecer problemas na parte física da equipe. Se o marketing e o setor de arrecadação não estiverem em congruência com a gestão do clube e os salários atrasarem o nível técnico da equipe pode não se sobressair, mesmo contando com grandes jogadores
Enfim, não quero aqui tirar o peso dos atletas no resultado final de uma equipe. Eles sempre foram e continuarão sendo os principais artistas do espetáculo. Pretendo, porém, abrir a discussão e trazer que a complexidade de um clube, ou até de uma seleção, nos seus mais variados setores tem uma influência muito grande em cima do que acontece dentro das quatro linhas. Não é balela falar em clube organizado, trabalhando com uma visão sistêmica, com os setores integrados com a mesma visão. Isso dá resultado. Isso funciona. Do presidente ao porteiro todos tem influência no resultado final. Vence não quem tem os melhores jogadores. Vence quem tem a melhor dinâmica de relações internas e consegue responder melhor as demandas do ambiente.