Sempre falo que jogador de futebol que chega a uma equipe profissional passa, em sua trajetória, por situações que a maioria das pessoas não aguentaria. Entender o lado humano me faz ter mais cautela ao dirigir qualquer crítica: como falar que um atleta é ruim se ele passou cerca de dez anos nas divisões de base, avançando de categoria, em uma disputa mais acirrada que vestibular de medicina? O mau momento no profissional pode ser, talvez, relacionado as ideias do treinador ou a algum problema fora de campo, mas afirmar que fulano ou beltrano não tem qualidade, ainda mais quem chega a uma equipe grande, não me parece o mais correspondente a verdade.
A tragédia no CT do Flamengo colocou luz em problemas que quem acompanha o futebol mais de perto sempre soube. Porém setores da sociedade, que apenas vêem os gols e acompanham os placares, não sabiam, de fato, o que um menino da base passa até virar um homem do profissional. Meu ponto aqui não é julgar o que houve no incêndio. As autoridades farão isso. Entretanto quero destacar a força mental, a resiliência, a crença fortalecedora que todo garoto tem que ter para conseguir construir uma carreira no futebol.
Acompanhando reportagens em programas que não cobrem o dia-a-dia do futebol vimos garotos que saem de suas casas, com dez anos de idade, para morar em um centro de treinamento em outro estado. Em que pese alguns terem nos clubes cinco refeições diárias, ao passo que em suas casas teriam apenas duas, onde fica o carinho, o afeto e a proximidade familiar tão fundamentais para o pleno desenvolvimento humano? Por mais desestruturada que possa ser a família, de um jeito ou de outro ela resguarda esse menino estando próxima a ele.
O lamentável acidente aconteceu em clube gigante, que tem uma das melhores estruturas do país. O que dizer de clubes menores? As instalações, condições de higiene, a própria alimentação, o acompanhamento psicológico, são de qualidade? Tenho dúvidas…
Portanto ao ver um jogador em uma equipe profissional o mínimo que posso ter por ele é respeito. Respeito pela trajetória, por passar por dificuldades que talvez eu não teria condições de enfrentar. Em algum momento, todo jogador já foi o melhor da sua turma, do seu bairro, da sua escola. E em todos os momentos ele foi um touro na parte mental. Futebol profissional definitivamente não é para amadores.
ARTIGO escrito por Marcel Capretz
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