Todos os anos, no 2º Domingo da Páscoa, que foi celebrado no último final de semana, a Igreja Católica repete em sua Liturgia a passagem do Evangelho em que Jesus Cristo aparece aos discípulos reunidos e, depois, também a São Tomé, que estava ausente na primeira aparição (Jo 20,19-31).
A Igreja repete esse texto, assim como repete o Evangelho da Paixão na Sexta-feira Santa e no Domingo de Ramos, por um motivo muito importante: dar sempre testemunho da Verdade.
O Papa Bento XVI afirmou que o maior serviço que a Igreja pode prestar à humanidade é o anúncio da Verdade. E o anúncio da Verdade, hoje, se faz em um mundo marcado por mentiras. Certas coisas caem nas redes sociais e parece que viram verdade.
Até pessoas de fé começam a acreditar neste ou naquele comentário como se fosse algo real, deixam aquelas mentiras agirem em suas vidas.
Além disso, neste mundo de mentiras, infelizmente, até homens e mulheres de fé, quando escutam a Palavra de Deus, não se deixam orientar por ela.
Não se perguntam como viver as suas vidas conforme a vontade do Senhor. Com isso, parece que a Verdade fica restrita às quatro paredes da igreja, ao ambiente onde praticamos o culto.
Ou seja, nós celebramos a nossa fé, mas nos esquecemos que essa fé deve formar e transformar as nossas vidas. Esquecemos que somos chamados a testemunhar a nossa fé no mundo, transformando-a em gestos concretos.
É por isso que o serviço mais importante que a Igreja pode fazer ao mundo é o testemunho, o anúncio da Verdade.
Não podemos adaptar a Palavra de Deus ao gosto ou às expectativas das pessoas, não é possível tornar o anúncio do Evangelho mais atrativo, falsificando a mensagem para torná-la mais “aceitável” aos costumes e ao modo de pensar e de agir das pessoas em cada tempo. Se a Igreja fizesse isso, estaria falsificando a Verdade do Evangelho, a Verdade que liberta e transforma.
Dito isso, volto à Verdade que o Evangelho repetido todos os anos no 2º Domingo da Páscoa nos revela: à comunidade reunida, o Ressuscitado se faz presente.
A repetição desse texto não é por um motivo qualquer, mas por um motivo teológico e pastoral muito sério. É para recordar que Jesus estava presente na comunidade reunida, entre os apóstolos, os primeiros membros da Igreja.
As missas transmitidas pelas redes sociais são interessantes para levar a Palavra àqueles que, eventualmente, não podem estar presentes na celebração. Mas ela não pode substituir a nossa presença física na igreja, onde recebemos a Eucaristia e temos a presença real do Cristo Ressuscitado.
São João Paulo II dizia que “a Igreja faz a Eucaristia e a Eucaristia faz a Igreja”, ou seja, evidenciando também a importância de estarmos presentes, reunidos para celebrar.
Ao se colocar entre os discípulos, como nos narra o Evangelho, Jesus concede o primeiro dom da sua presença: a Paz! “A paz esteja convosco”, disse (Jo 20,19). O texto bíblico nos diz ainda que Cristo “envia” os apóstolos, ou seja, dá a eles a missão de anunciar a Verdade da ressurreição. Em seguida, o Ressuscitado sopra sobre eles o Espírito Santo.
Tomé, no entanto, não estava lá quando o Senhor veio. Os apóstolos, ou seja, a Igreja que ali estava, que acabara de receber a missão e o Espírito Santo, anuncia a Tomé a Ressurreição de Cristo, mas o discípulo não crê porque não viu. Oito dias depois, quando aquela comunidade estava novamente reunida (e agora Tomé está com eles), Jesus aparece novamente.
A presença do Ressuscitado ali, no entanto, não é simplesmente para satisfazer a curiosidade do apóstolo que só acreditaria vendo, mas é para confirmar o anúncio feito pela comunidade, pela Igreja. É para confirmar que aquilo que Igreja de Jesus Cristo anuncia é a Verdade.
Esta Verdade não pode ser “escurecida”, trocada, abandonada ou esquecida. Porque esta é a Verdade que leva à plena libertação das pessoas, que dá vida nova. Tomé, ao ver Jesus ali, não como um espírito, não como um fantasma, mas em carne e osso, ao tocar as marcas dos pregos e o lado de Cristo, faz uma profissão de fé, reconhecendo a Verdade: “Meu Senhor e meu Deus”, disse o apóstolo (Jo 20,28).
Mesmo assim, Jesus vai dizer ao discípulo que duvidou do anúncio:
“Acreditaste, porque me viste? Bem-aventurados os que creram sem terem visto!” (Jo 20,29). Bem-aventurados também somos nós que recebemos o anúncio da Igreja e confiamos neste anúncio e nos comprometemos a ser testemunhas do Ressuscitado que se coloca no meio da comunidade reunida.
Nós não vimos como Tomé viu, mas podemos testemunhar a presença real de Jesus entre nós quando proclamamos a Palavra e recebemos o Senhor na Eucaristia.
Somos alimentados cada vez que celebramos este mistério de fé. Por isso não somos chamados a confiar nas mentiras anunciadas pelo mundo, nas inverdades proclamadas, nem a confiar as nossas vidas em “certezas humanas”.
Somos chamados a confiar na Verdade fundamental da nossa fé cristã: Cristo ressuscitou, está ressuscitado! E a Ressurreição de Cristo faz novas todas as coisas.
Esse é o grande acontecimento que precisa ser testemunhado. Sejamos, então, testemunhas em um mundo que não conhece a Verdade. Sejamos nós também aqueles que anunciam a Verdade pela nossa maneira de viver. Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo.
Por Dom Devair Araújo da Fonseca – Bispo de Piracicaba