18/03/2016
Meireles, o pintor brasileiríssimo 2
ARTIGO | Vimos um Vitor Meireles técnico, cujo pendor para a pintura se manifestara no desabrochar da infância; como diz Salomão em Provérbios 20:11: “Até à criança se dará a conhecer pelas suas ações…”. Sim, Deus lhe deu a pintura como dom, como presente ao menino Vitor. Vamos, agora, estudar um pouco sobre o Vitor humano, sua parte física, sentimentos e moral, ou seja, sua vida humanitária.
Vitor Meireles nasceu como vimos, num lar modesto, pobre, tão pobre que não tinha dinheiro para retirar seu quadro da alfândega ao chegar da Europa onde fora expor sua tela, teve de emprestar dinheiro para tanto.
Aos cinco anos de idade começou a ser educado em latim, português e aritmética e começou a se destacar em todas as matérias, foi um aluno exemplar, apesar de fazer desenhos de bonecos, caricaturas e paisagens durante as aulas e intervalos. Aos 10 anos copiava estampas litografadas que lhe chegavam às mãos; fazia garatujas e caricaturas dos fregueses que se reuniam na loja do seu pai Antônio (conforme diz José Arthur Boiteaux).
Seus biógrafos o retratam como homem pequeno, modesto, metódico, sem vício e humilde. Gonzaga Duque diz que Vitor era de “pele morena… seus olhos são grandes e negros; usa cabeleira à romântica, que lhe emoldura bem o rosto, porque é anelado e grisalho; o bigode é farto, retorcido nas pontas, um pouco à militar, um pouco à poeta…Não lhe falta um botão na sobrecasaca, um pouco de goma nos colarinhos, um pouco de betume nas botinas… o homem que vemos atravessar a rua do Ouvidor, sem companheiros… depressa sempre apressado, asseado… arzinho de preocupação…olhar perdido no espaço… Trabalha com aferro, sem limites, trabalha todos os dias, metódico, calmo, paciente.” Homens Que Fizeram o Brasil, 271.
Diz Chiquinha Neves Lôbo, uma de suas biógrafas: “Vitor Meireles sempre dedicou às crianças carinho paternal, aos animais… incondicional piedade… Para ele, perdoar era dever, fosse qual fosse a falta… modesto…”
D. Chiquinha ainda conta que Vitor Meireles e o pintor belga Langerock pintavam juntos o panorama do Rio de Janeiro, mas alguns ratos fizeram estragos nos seus trabalhos. Langerock resolveu colocar veneno e ratoeiras para solucionar o problema. “Vitor no seu habitual bom humor lhe disse: ‘Não vejo razão para ficares desesperado’. E o belga lhe deu três dias de prazo; prazo suficiente para que os ratos não estragassem mais o quadro.
_ “Que fizeste Vitor?”
_ “Apenas aconselhei-os a não estragar o trabalho dos outros.”
À noite o belga foi espiar o que Vitor fazia; notou que ele espalhava pedaços de queijo, toicinho, doces, ao redor das telas. Depois Vitor voltou para a cama mansamente para não acordar seu colega. “De repente abre-se a porta” aparece Langerock, alto, “envolto num cobertor”… disse-lhe:
‘_Ora Vitor! Assim desta maneira virão morar aqui todos os ratos da Bélgica!’
‘_E que mal haverá nisto, se não fizerem estragos? O que lhes dou não faz falta, são apenas restos dos que já estão fartos. Se todos fizessem aos homens o que fiz aos ratos, não haveria pelo mundo tanta gente a morrer de fome, e outros de indigestão… ’ Homens Que Fizeram o Brasil, p.270.
Não parece que Vitor era panteísta, ou um adorador de ratos divinizados, e tirando o exagero de manter a praga de ratos, o pintor brasileiro era bondoso como deve ser o cristão. Temos muito a aprender desses grandes brasileiros!
Antônio Parreiras, um dentre seus vários alunos, relata: ‘Eu o vi morrer lentamente, já velho e abatido… pobre e humilde… cabelos longos, brancos em desalinho, de beleza austera, olhos de bondade, mão muito fria entre as minhas’, “disse ele:”
‘É chegada a hora, eu t’a anunciei na última carta… Deus lhes perdoe.’