A notícia pipocou nos meios de comunicação: entrevista de Rodrigo Janot ao jornal O Estadão (26/09/19) revelava que o ex-procurador geral da República entrara armado no prédio do Supremo Tribunal Federal (STF) com a intenção de matar o ministro Gilmar Mendes.
A estratégia faz parte do marketing de divulgação do livro que ele vai lançar contando episódios de sua carreira e vida. Nada mais oportuno que essa informação bombástica.
“Não ia ser ameaça não. Ia ser assassinato mesmo. Ia matar ele (Gilmar Mendes) e depois me suicidar”, disse Janot ao Estado.
O ex-procurador Janot não pode ser incriminado por essa declaração, porque o planejar e preparar um crime não é crime (não passou do pensamento, da ideação sinistra). Como advogado experiente, sabe ele que não pode ser responsabilizado. O nosso Código Penal prevê que o crime tem os atos preparatórios, executórios e a consumação.
Interessante que os inimigos de agora, que acalentam ódio recíproco, já foram amigos e, “nos anos 1980, Janot e Gilmar tomavam cerveja juntos na Europa”.
Qual o motivo desse ódio, então? O ex-procurador explica: “Foi logo depois que eu apresentei a sessão (…) de suspeição dele no caso do Eike. Aí ele inventou uma história que a minha filha advogava na parte penal para uma empresa da Lava Jato. Minha filha nunca advogou na área penal… e aí eu saí do sério…”.
Parte da população brasileira que acompanha as questões políticas e econômicas tem manifestado desagrado com o STF, especialmente com o ministro Gilmar Mendes, inclusive divulgando vídeos de ataque à pessoa dele quando encontrado em espaços públicos ou em eventos.
Essa ideação de assassinato não corre por conta do sistema judiciário brasileiro, mas por um entrevero (ódio) entre eles. E isso repercute na crença do brasileiro: se nem ele, um procurador geral da República, acredita no STF ou no sistema legal do país, como a população vai acreditar? Uma ação como essa dispara a ideia de que não é pela lei e sim pela violência que se resolvem as questões no Brasil.
Na opinião do professor Antonio Euzébio Filho, do Departamento de Psicologia da USP: “Os sentimentos disseminados de indignação e desesperança contagiam os indivíduos, que passam a se comportar de forma coletiva, muitas vezes movidos exclusivamente por suas paixões, gerando acirrados confrontos”.
Numa entrevista à Revista Galileu, Gary Slutkin, que é um epidemiologista americano, conta sua experiência por alguns países: “Notei que a violência é uma doença contagiosa assim como a malária, a cólera e a tuberculose. Se não conseguimos entender suas motivações, não entenderemos suas causas”.
Estamos distantes da luz e da serenidade daquele jovem nazareno que exortava: “Amai a vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam, e orai pelos que vos maltratam e vos perseguem; para que sejais filhos do vosso Pai que está nos céus…” (Mateus 5:44).
ARTIGO escrito por Arnaldo Divo Rodrigues de Camargo é especialista em dependência química pela USP/SP-GREA
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