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Contos do Caipira: O retorno do Sítio do Ipê

Foi pensando nos estudos que obrigamos nosso irmão a vender o nosso sítio.
Era o meu sonho estudar nos Estados Unidos.
E para isso eu fui a primeira a dizer: “Nós temos que vender o Sítio do Ipê”.
Não me importando com o sofrimento do nosso irmão, que cuidava de tudo com carinho e dedicação.
Mas nós conseguimos e o dinheiro foi repartido, e eu fui para os Estados Unidos.
Os outros irmãos, também resolvidos, e o sítio foi vendido.
Sem pensar no irmãozinho, que sofreu tanto até morrer.
Hoje casada, tenho esposo e a criançada, tenho tanto dinheiro, ganho muito no que fui formada.
À noite acordo no desespero, resolvi sair do estrangeiro e, agora, com dinheiro, vou comprar tudo de novo.
O sítio de nossa família posso pagar até o dobro.
Reuni meus filhos e meu marido: “Vamos embora dos Estados Unidos. Quero comprar o sítio e deixar todo florido”.
Quero ver o ipê roxo e o amarelado, quero sentir o perfume das flores e balançar na rede da varanda, e passear a cavalo.
Em memória do meu paizinho, quero plantar de novo no caminho, na entrada dos dois lados, para sentir de longe o perfume
Que trago até hoje no peito guardado.

Vendemos nossa casa, ficou tudo decidido entre as crianças e o meu marido.
E o dia era chegado, quantos anos se passaram!
Chegamos ao aeroporto, o meu coração palpitava.
Um carro de luxo ali mesmo nos esperava, um hotel reservado, e tudo se ajeitava.
O sol nesta manhã brilhava, fui pedindo informação, porque com o tempo percebi que tudo mudara.
O rapaz que nos levava, ali tudo conhecia. “Vou levá-los pra ver as terras”, assim ele dizia.
Dobramos uma esquina, o asfalto novo, casas bonitas, e nunca o sitio eu avistava!
Foi me dando um desespero, ao moço fui perguntando: “Por quê?”
“Tanta volta?”
Ele para o carro num bairro de casas populares, e eu fui perguntando… “O que aconteceu?”
“O moço quer mais dinheiro?”
Foi aí que ouvimos o que jamais esperávamos:
“Doutora,
Estamos exatamente no seu sítio, bem aqui.
A senhora vai entender:
Depois que o sítio foi vendido, seu novo dono acabou desiludido.
E o sítio novamente foi vender, as terras foram desmembradas, as árvores foram derrubadas.
Nada mais resta do Sítio do Ipê.
Está vendo aquela placa?
A rua principal traz o nome do seu pai.
E a praça leva o nome do seu irmão.
E o prefeito desta cidade, que logo irá conhecer, em homenagem ao seu pai,
A este lugar deu o nome ‘Bairro do Ipê’”.
Desci do carro e nada mais vi. Ali mesmo fui caindo, o sentido foi sumindo.
E acordei num hospital, comecei a entender, e pude, depois de tanto tempo, passar pelo que passou nosso irmão
Quando o sítio nós o obrigamos a vender.
Levantei daquele leito de hospital e pedi para procurarem meus outros irmãos, que nunca mais tive contato.
Mas primeiro eu queria conhecer o prefeito da cidade, e saber o porquê daquela barbaridade.
Chegamos à prefeitura, ainda com um pouco de tontura.
E para falar com o prefeito, não tive dificuldade,
Por ser também uma autoridade.
Quando entramos no gabinete, foi tão grande a minha emoção!
O prefeito nos mandou entrar e, apertando a minha mão, a minha história termina ali.
Com abraços, suspiros, dor, saudades.
Foi quase parando o meu coração.
Porque o prefeito daquela cidade, onde eu nasci,
Era um dos meus irmãos.

Jornal O Semanário

Esta notícia foi publicada por um dos redatores do jornal O Semanário, não significa que foi escrita por um deles, em alguns dos casos, foi apenas editada.

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