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Contos do Caipira: Cipó São João

Naquela tarde de junho, cheguei a chorá!
Não sei se foi de tristeza ou de alegria.
Mas percebi que do meu rosto duas lágrimas corria.
Meu pedaço de chão, meu sítio do coração.
Eu tocava sozinho, plantava, e da criação eu mesmo cuidava. Tinha de tudo!
Mesmo sozinho nada me faltava.
Um dia precisei do sítio me ausentar. Fiquei doente. Fui internado pra me tratar.
Mas deixei o sítio pra um amigo, vizinho, pra que enquanto eu tivesse fora, ele mesmo me disse:
– Fique sossegado!
– Que do sítio e de tudo o que precisar eu vou cuidar.
Passando muito mal, demorando pra recuperar, mas não via a hora de pra casa retornar.
Porém, chegou o dia que o doutor me deu alta.
Dizendo que já podia até cavalgar!
Que alegria eu senti naquele instante. Fui buscar meu cavalo, que há tempos deixei no piquete ali de um bar.
Cavalo foi bem cuidado, bem tratado!
Paguei pelo trato e arriei. Montei no lombo, meio devagar, e saí a caminho do meu pedaço de chão, meu sítio do coração.
Fui chegando passo lento, meu cavalo andava, parecia até que conhecia o caminho.
Cheguei, desci do cavalo, soltei as rédeas no chão.
Pro cavalo pastá um pouco tirei o freio e o abridão.
Mas não havia percebido!
Fiquei parado por um instante!
Aí que me chamou a atenção.
A porteira do meu sítio, fechada, mas notei que algo estranho estava acontecendo.
Esta porteira parecia estar lacrada, toda coberta de Cipó São João!
E mesmo que eu quisesse, não conseguia abrir a porteira com a mão.
E chorei, chorei de emoção!
Por fora a mais linda imagem, e o perfume do Cipó São João.
Mas por dentro, quando consegui entrar, a tristeza tomou conta do meu coração.
Tudo encoberto pelo mato, eu não via minha criação.
A roça de milho apodreceu seus pés!
As espigas estavam com brotos no chão!
Eu chorava a cada passo que eu dava, vendo meu sítio abandonado, parecendo um sertão.
O sítio ficou abandonado. O amigo não teve o cuidado que me prometeu!
Abandonou tudo, a casa fechada, como que abandonada.
Nenhuma criação!
O mato batia nas canelas, podia se ver olhando pela janela.
Saí caminhando pelo mato, capim alto, mas por um instante parei!
Uma criação, ali no capim, brava comigo, pois quase pisei no seu ninho.
Uma galinha com seus pintinhos, acabando de picar!
Logo, na minha imaginação, notei que nem tudo estava perdido e abandonado.
Com a galinha e os pintinhos, que logo seriam meus franguinhos, ou novas galinhas, poderia começar tudo de novo. Não perdi a esperança!
No outro dia saí limpando tudo, cortando o mato, reformando os galinheiros.
Em pouco tempo, minha criação de galinhas e frangos, galinhas poedeiras, nova plantação de milho, novas máquinas, o moinho, e vendendo ovos pra vizinhança inteira.
Meu sítio, meu sustento, minha vida, meu talento.
A inclinação e a felicidade de volta.
E na porteira, agora bem cuidada, havia sim o perfume, a beleza.
Fiz um arco passando por cima da porteira e dos lados, bem cuidado.
Mês de junho, quanta beleza coroando o meu sítio, quanto orgulho, que satisfação!
As lindas flores do Cipó São João!

Toninho Junqueira

Toninho Junqueira é locutor há mais de 40 anos, escritor e restaurador de cadeiras antigas e imagens sacras. Desde 2021, conduz sua própria rádio, a São Gonçalo, com 24 horas de programação sertaneja raiz. Fale com o autor por telefone ou WhatsApp: (19) 99147-8069.

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