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Adílson Baptista e a terceirização da culpa. É sempre o outro.

Marcel Capretz, colunista esportivo

Eu não estou satisfeito com a qualidade do jogo do futebol brasileiro. Tenho plena certeza de que poderíamos fazer mais e melhor.

Os problemas e os seus diagnósticos são amplos, complexos e multifatoriais. Não há apenas uma razão que explique a baixa beleza dos nossos campeonatos. Para ficarmos na ‘página dois’: gramados, formação de jogadores, formação de técnicos, gestão esportiva, amadorismo dos dirigentes, impaciência e violência de alguns torcedores, más condições de acesso aos estádios, calendário, corrupção. São alguns pontos que acontecem aqui e acolá – claro, com boas exceções – mas que juntos fazem o nosso futebol estar na segunda, caindo para a terceira divisão mundial.

Eu como imprensa também tenho minha parcela de contribuição. Estamos formando uma massa crítica de torcedores? Ou alimentamos o ‘ganhou é bom, perdeu não serve’? Dentro da cadeia futebolística, valorizamos dirigentes austeros, que buscam a integridade e a assertividade em suas tomadas de decisões ou defendemos o ‘ganhar a todo custo’? Sei que ainda tenho muito o que evoluir e aprender, mas tenho estudado incansavelmente para decifrar o porque de derrotas e o porque de vitórias no futebol.

Faço essa contextualização porque me causou estranheza a entrevista coletiva do técnico Adílson Baptista, após o empate América- MG 0 x 0 Ceará, no último final de semana. Reproduzo abaixo alguns trechos:

– Não adianta nós ficarmos reclamando, nós treinadores e atletas, para apresentar um jogo de bom nível… dá para tirar as 20 datas de Estadual, que não vale nada, não leva a lugar nenhum, não joga contra ninguém. Aí fica esse futebol que vocês estão vendo: lento, preguiçoso . É político, é um reflexo do que estamos vendo aí, só tem ladrão neste país. É desgaste. Eu já defendo isso há anos. Campeonato estadual é um atraso no futebol brasileiro. Lugar nenhum do futebol mundial tem campeonato estadual. Só na várzea aqui do Brasil. Aí vão ver isso aí. Tenho que defender os atletas: fica lento, preguiçoso. Eu assisto Campeonato Inglês, você acha que eu assisto Série B? Eu não perco meu tempo. Assisto Campeonato Inglês, Campeonato Alemão, Espanhol. A gente vai assim mesmo, jogos ruins, jogos lentos. Eu fico triste como profissional.

Adílson tem muita razão quando ele cita o calendário. É um dos problemas da baixa qualidade do nosso espetáculo. Porém ao colocar essas palavras, ele se exime de toda e qualquer responsabilidade do processo. Quer dizer que ele como treinador não tem culpa de nada? Ele é apenas uma ‘vítima’ do que acontece? Mesmo com a pausa para Copa, o time dele está cansado por conta do campeonato estadual? O futebol então é só físico, é só o cansaço que conta? Ou o jogo é também físico, mas também técnico, tático, emocional, cognitivo, espiritual, etc?!….Não aceito isso as justificativas de Adílson.

A terceirização da responsabilidade dos nosso problemas é o pior cenário para encontrarmos soluções. Porque se somos frutos do que acontece conosco, para que tentar mudar então, não é mesmo?

Adílson Baptista, que já teve oportunidades em equipes grandes, como Cruzeiro, São Paulo, Corinthians, deveria buscar como melhorar a qualidade dos seus treinos para que sua equipe seja intensa por 180 minutos semanais. Como ele pode evoluir como treinador para que mesmo diante das circunstâncias o trabalho dele se sobressaia. Culpar o calendário, a estrutura, ‘os ladrões’, o dinheiro (ou falta dele) é muito fácil. Não dói. A culpa é do outro. Desse jeito fica difícil mudar. E seguimos com mais do mesmo.

 

ARTIGO escrito por Marcel Capretz
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Jornal O Semanário

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