Neste espaço trataremos da segunda parte do chamamento: Nossa Língua. O Semanário é um jornal eclético e democrático, o que me permite peregrinar pelos vários campos do saber, além do filosófico e teológico podemos entrar no campo da linguística.
Não tenho formação específica, mas arranho a portuguesa, inglesa, grega Koiné, latim, aprendi algumas palavras do tupi-guarani, assim, vamos tentar algumas curiosidades etimológicas e semânticas de nossa língua, e posso m estribar no meu livro A Curiosa Orígem das Palavras.
A língua é o meio de comunicação que usamos desde o dia que aprendemos a falar, e, apesar do isolamento social a que se colocam os viciados na telinha, ainda é o mais utilizado. A língua é um organismo vivo, nasce, cresce, modifica-se, desaparecem algumas palavras, outras surgem, é dinâmica.
O latim, o koinè grego e outras línguas morreram, e quão diferente é a língua portuguesa de Pero Vaz de Caminha (leiam sua carta) da falada hoje. Euclides da Cunha (1866-1909), escritor, jornalista do Estadão, enviado como repórter sobre a Guerra dos Canudos possuía um glossário muito rico, usava de regionalismos e neologismos (criação de palavras novas, ou dar novo significado a outras) de maneira que aqueles que leram Os Sertões, assim como eu, tiveram de usar bom dicionário.
O competente Guedes de Oliveira publicou o artigo “Os Sábios” neste jornal (8/5/20) onde observa-se o vocabulário tão diverso do coloquial hodierno (releiam, vale à pena). Não precisa ir tão distante, vejam os leitores paulistas se entendem a linguagem gaudéria (gaúcha):
“Ganhei um chasque pra ir a uma querência. Passei umas treze lombas e quatro sinaleiras, então vi uns guascas, na verdade era uma indiada meio abichornada e umas chinas que me ensinaram onde era o pago. Bah! Foi uma peleia pra chegar antes do churrasco de chão, que tinha chuleta, ponta de ripa, vazio e galeto, tinha chimarrão e bergamota pacas. Bah, guria, tinha até xis, tri legal, deu vontade de fazer uma vianda.
Arrecém cheguei, vi o fandango. As prendas fatiotas e os guapos com pilchas, botas e guascas apresentando uma chula num palanque no banhado. Eu estava lá mosqueando, e báh, me aprontaram uma trampa, fizeram-me participar do entrevero; tinha de laçar uma rês mais rápido do que os vaqueiros.
Como não sou abagualado, vi no meio de uns matungos, um tordilho, montei toquei-lhe a espora, lacei talagaço duas rezes pelas guampas. E não estou trovando. Minha gibeira ficou cheia. Na volta, peguei a faixa e encontrei um guri abichornado e dei-lhes uns pilas pra ele e fui lomba abaixo. Na faixa preta, tomei uma pechada, fui ao lateiro, em frente à carniceria. Barbaridade tchê! Lá se foram meus pilas!
Matute o leitor, nestes regionalismos nordestinos:
Sou um cabra arretado. Vi um batoré desmilinguido, aperreado com camisa afolesada e malamanhado querendo sarrar uma cabrita cotoco, zaroia e zambeta, aí eu quis ser o corta-jaca e disse para o batoré: Abilolou de vez, foi? Assunta bem, não seja abiscoitado!
Amanhã não fique empazinado nem avexado, não venha fubento, mostre que é um enxerido, não seja froxo, nada de pedir penico. Noutro dia o cabra veio com um gibão como se fosse um galalau, eu disse leve a cabrita comer um girimum com jabá e macaxera, depois vão ao rela-buxo. Vai ser pai d’égua! Não seja pirangueiro.
Não critique o linguajar que lhe pareça inculto como diz Antônio Gonçalves da Silva, o Patativa Assaré (1909-2002), apesar de analfabeto (meses de escola), cego de um olho, foi um dos maiores poetas e repentistas do Brasil, e… filósofo popular:
“É melhor escrever errado a coisa certa do que escrever certo a coisa errada”. Note um trecho de uma de suas poesias:
“Sou um percevejo que canta
Com vontade e esperança
de vê um Brasil mió
Mas o Brasil continua
O canto da perua que é pió, pió,pió!
Leiam as poesias de Bráulio Bessa, Jonas Andrade e de Patativa, mestre em poesia e comunicação.
Comunicação da mais alta qualidade revelando o talento que Deus conferiu a esses brasileiros nordestinos, compatriotas que nos orgulham, tanto quanto os poetas e cancioneiros gaúchos e de outros rincões do torrão nacional.
(Um bombom para quem me der a tradução destes textos até terça-feira, desde que não tenha tido contato com gaúchos e nem com nordestinos)
Tradução na próxima edição.
ARTIGO escrito por Leondenis Vendramim, professor de Filosofia, Ética e História. Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião do jornal. São de inteira responsabilidade de seus autores.