Leondenis VendramimOpinião

A doutrinação mais perigosa 2

08/07/2016

A doutrinação mais perigosa 2

Leondenis Vendramim é professor de Filosofia, Ética e História (Foto: Arquivo pessoal)
Leondenis Vendramim é professor de Filosofia, Ética e História (Foto: Arquivo pessoal)

ARTIGO | No artigo último vimos que o movimento Escola Sem Partido está tentando incluir na Lei de Diretrizes de Base da Educação Nacional o PL 867/2015 visando proibir o ensino de conteúdos de “doutrinação ideológica” sobre política, religião e sexo. Em Alagoas já impera essa legislação. O Movimento oferece um modelo sugestivo de notificação anônima para pais denunciarem professores e diretores de escolas onde se pratique a “doutrinação”. Li na Folha de S. Paulo (19/5/16, p C8), a coluna de Contardo Calligaris, doutor em Psicologia clínica, dramaturgo, escritor, colunista da Folha, cujo título utilizei para minhas considerações.
A princípio quero lembrar que a linha limítrofe entre constatações bíblicas e doutrinar, falar sobre homossexualismo como fato social e opinar sobre tal, explanar sobre a política e partidarismo sem transparecer a preferência é tão tênue, que alunos farão delação por antipatia a certos professores. O Dr. Calligaris diz ser contra todo tipo de doutrinação, mas lhe “parece impensável que eles não entendam nada e não leiam nada de um pensamento (sobre marxismo), que foi a maior paixão intelectual do século 19 e… 20… que não leiam nada do livro (Bíblia) que foi a referência central da cultura ocidental durante séculos”.
Outra verificação é que todo argumento contrário ao ensino ideológico é também ideológico. Assim, ensinar contra a crença da existência de Deus e contra o criacionismo por ser ideológica, é ideologia em defesa do ateísmo e do evolucionismo. “Não tem pensamento que não seja ideológico” diz o Dr. Calligaris. Assim, não há como lecionar sem expressar o pensamento. Escola moderna é aquela que permite a todos (alunos, docentes, diretor, funcionários e a toda a comunidade escolar) expressar suas ideias, descobrir outras ideologias, ter liberdade para agir conforme suas convicções. Não obstante, é inconcebível um professor não corrigir pensamento ou ideologia imoral ou paradoxal a uma verdade. Como não corrigir hábitos ou ideologia da cleptomania política na escola? Noutro extremo nenhum discente deve ser obrigado a aceitar a imposição de doutrinas de qualquer confissão religiosa, porém é cultural conhece-las. Ninguém pode ser coagido a adotar um partido político ou ter um comportamento sexual diferenciado de sua anatomia, mas nada deve impedir que se expressem ideias contrárias e permitamos aos demais a mesma liberdade. Diz o articulista citado: “A maior garantia contra conteúdos ‘invasivos’ deveria ser a variedade das ideias que uma criança encontra na escola”. A Bíblia nos ensina que “na multidão de conselheiros há sabedoria” (Pv. 11:14).
Caso a escola seja impedida de colocar suas ideias, onde as crianças e adolescentes as encontrarão? Nos pais? Na sociedade dos botecos? Quem pode afirmar que os pensamentos deles são corretos? É mais coerente que todos (inclusive os professores) tenham direito de expor suas ideologias e cada qual usar o livre arbítrio.
Qual professor sentirá segurança diante de alunos delatores, diante da ameaça do Escola Sem Partido. Essa filosofia tem aparência escorreita e democrática, mas tal propositura encabresta os educadores e limita o aprendizado.
Se o professor tem uma classe heterogênea de diversos credos religiosos, filhos de pais homo e outros heterossexuais, e de vários partidos políticos, de variadas culturas e etnias, o que restará para o mestre ensinar? Não poderá ensinar sobre a cultura afro-brasileira aos cristãos, sobre a influência do protestantismo na formação dos EUA, nem sobre a Reforma e Contra Reforma, nem sobre a formação política brasileira, senão para alunos cujos pais sejam concordes. Se adotado o Escola Sem Partido, formar-se-ão cidadãos estrábicos, uníloquos e unialados. Não é isto que a sociedade espera, não é o que Deus pretende da educação, mas esperam-se cidadãos críticos, que conheçam os vários caminhos e soluções e escolham o melhor, que saibam resolver problemas e liderar pessoas divergentes de forma harmônica para o sucesso, otimizando o tempo, a economia e a moral.

Jornal O Semanário

Esta notícia foi publicada por um dos redatores do jornal O Semanário, não significa que foi escrita por um deles, em alguns dos casos, foi apenas editada.

Artigos relacionados

Botão Voltar ao topo