ArtigosRubinho de Souza

A dor da saudade

Hoje a saudade veio bem devagarinho, como quem não quer nada, me convidando a relembrar, se aproximou, e com jeitinho, me abraçou e não me deixou até que eu escrevesse estas poucas linhas, que vos faço com lágrimas nos olhos.

Primeiramente, peço que me desculpem os mais novos e também os insensíveis, pois, continuo mais saudosista do que nunca. É impressionante como isso de gostar de recordar os velhos tempos, se parece com uma sarna, que quando mais se coça, mais dá vontade de se coçar.

Não me recriminem, pois não tenho culpa se sou assim e se vivi numa época em que criança era criança de verdade, numa época em que à noite se contava estrelas no céu – só não podia apontar o dedo para elas, porque nasciam verrugas na ponta dos dedos – diziam… tempo em que se admirava o brilho da lua e acompanhava a trajetória que ela fazia, por detrás das nuvens.

Nas noites quentes, a gente se divertia, a correr, atrás de vagalumes para ver quem conseguia pegar um maior número deles. A gente ficava encantado com aquela sua luzinha verde a brilhar na escuridão – era algo mágico para nós, em nossa inocência de criança.

Nos dias de chuva, o mais gostoso, era quando a chuva começava a cair e ao molhar o chão de terra de nossas ruas, trazia aquele cheirinho característico de terra molhada, para mim um perfume inesquecível, que ao lembrar parece-me sentir aquele cheiro.

A dor da saudade
A dor da saudade

E a gente saia correndo rua afora, na chuva e sem guarda chuvas ou qualquer outra proteção, pois o nosso prazer estava em sentir a chuva a encharcar nossos cabelos, nosso corpo, até escorrer pelos pés. Andava pela enxurrada e não ficava doente, nem resfriado pegava. Eram outros tempos!

Nos dias de frio, todos da casa, se reuniam à beira do fogão a lenha, para se aquecer. Logo saia um café feito na hora que a gente tomava na caneca e comia polenta ou mandioca fritas na hora.

O calor do fogo nos aquecia o corpo e o amor de nossos pais e de nossos irmãos, aquecia o coração.

Apertar as campainhas e sair correndo era para os mais peraltas, coisa que eu não fazia porque sabia que ao chegar em casa iria apanhar, pois, antes mesmo de pôr o pé na porta, meu pai já estaria sabendo e esperando com uma cinta na mão.

Subir nos pés de frutas, era a melhor parte de todas as nossas artes e a mais prazerosa – os irmãos Moreira tinham um trabalhão para nos manter longe dos pés de manga carregados de frutas em sua chácara, onde hoje é o bairro São Carlos.

Éramos muito felizes, pois mesmo tendo poucos bens materiais, a gente possuía a maior riqueza do mundo: uma família que nos amava, saúde e amizade com todos os moradores do bairro Padovani.

Todos os dias a gente estava junto, se encontrava para nos divertir e todos brincavam em harmonia. Se acontecesse uma desavença entre um com o outro, logo eram resolvidas pelos amigos do “deixa disso” – e a gente obedecia, fazendo as pazes com um sincero abraço. E voltava a brincar.

Se a gente soubesse qual seria o dia em que estava marcado em nossas vidas, para ser o último dia de nosso encontro, a última brincadeira, o último dia de nossa feliz infância juntos… a gente teria pelo menos, programado para uma despedida, um adeus e um último abraço bem apertado.

Ah, se a gente tivesse uma bola de cristal para prever nossos dias futuros e pudesse controlar nosso tempo, eu pediria a Deus, que me fizesse uma eterna criança…

Quando se é criança, rala-se o joelho jogando bola, o cotovelo ao cair de uma bicicleta, o dedo, jogando bastão com os amigos e dói muito, mas nada se compara à dor da saudade dos bons tempos de criança.

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