O rio da minha alma (parte 2)
Por Dario Bicudo Piai, engenheiro e perito judicial
– III –
Com meu canivete afiado, desenhei o nome dela
num cerne ancestral, tombado numa curva
quase inacessível e secreta do meu sagrado rio:
— Rachel, Rachel, tens o ouro e tens o mel,
e também um tesouro, bem guardado lá no céu!
Num repentino dia de verão, imitando os céus do Leblon
(perfeitos, límpidos e sem defeitos),
um portal e um azul-luz a levaram para o infinito:
— por que tão longe assim, ó Rachel?
— Guardo de ti as lindas tardes, os matinês,
os dropes que amaciavam nossos beijos,
teu calor, teus cabelos, tua cor,
as estradas, rolês e baladas;
nossos gins e cubas libres
os momentos bem amados e lembrados
ao som de Bee Gees, Creedense, Jhonny Rivers…
na lendária Rádio Mundial das noites madrigais,
depois de mil camparis e muito “rock in roll”.
Dancei com Rachel – à luz de neon,
as mais lindas canções
colado em seu corpo frágil
vestido de alças delicadas e sutis
e uma chuva sonora batendo lá fora –
para quem ama – infindas são as horas:
“sans fin sont les nuits d´amour”
(Paris flamejava com seu último tango)
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– IV –
Escutai, ó Deus, minhas preces
as liturgias nas horas vazias – ouvi!
estancai-me as lágrimas plangentes:
cada pranto, um langor
cada lágrima, uma saudade
em cada saudade, uma dor…
A efêmera e linda flor
ao som das corredeiras
persistia em seu clamor:
–Deixa-me aqui – ela dizia,
desnuda e sem pudor
o rio na pedra lisa corria,
corria levando a flor!…