Rubinho de Souza

A vida é uma ópera

“A vida é uma ópera”, dizia-me Américo Chiarini, que aqui morou, e que antes de ser barbeiro, funcionou como Delegado nomeado por Capivari para atuar em Vila Raffard, e dirimir pequenos conflitos na pequena Vila.

Eu que sempre gostei de conversar com os mais velhos do que eu, numa de nossas conversas, ele me explicou sua afirmação de tal maneira que me fez crer que tinha razão. Dizia ele que a vida tanto podia ser uma ópera, como peça de teatro, ou uma viagem de mar, ou ainda uma batalha e quem escolhe o que vai ser, somos nós os protagonistas.

O meu amigo dizia muitas coisas que somente hoje, passados muitos anos, é que reflito e acabo por lhe dar plena razão por tais afirmações.

Mas o que quero relatar hoje aqui é sobre um acontecimento da época em que Américo era delegado, e que por não ter terminado em tragédia, pode ser contado, pois acaba por ser diria eu, cômico…

O caso começa quando eu ainda não era nem mesmo um projeto de gente, e meu amigo trabalhava há alguns anos, como padeiro para um senhor da família Rodrigues da Silva, e esse senhor, tinha um irmão que também explorava o mesmo ramo de panificação.

Instalação da rede de água e esgoto na rua Armando Sales de Oliveira, em Rafard (Foto enviada pelo colunista)
Instalação da rede de água e esgoto na rua Armando Sales de Oliveira, em Rafard (Foto enviada pelo colunista)

Ocorre que o mesmo, sendo muito amigo de meu pai, pediu que ele deixasse o emprego na padaria do irmão dele, e fosse trabalhar na sua padaria, pois pagaria ao meu pai, um salário melhor. Meu pai, homem muito cauteloso, disse que iria, mas antes teria que falar com seu patrão para expor a proposta, e somente deixaria o emprego, se o seu irmão, não cobrisse a oferta de salário oferecida, senão teria que continuar onde já estava.

E assim foi feito. Sem ressentimentos de parte do seu patrão, meu pai saiu do emprego e foi trabalhar com o irmão dele por um melhor salário e assim todos continuaram amigos.

Ocorre que o velho Rodrigues da Silva, que era o pai dos dois amigos do meu pai, tomou as dores de um dos filhos, e ao encontrar meu pai numa rua de Vila Raffard, passou a ofendê-lo, dizendo que meu pai não tinha sido honesto com o seu filho Benedito, e tinha o deixado na mão. Meu pai ainda tentou fazer aquele senhor entender que ambos eram seus filhos, e que tanto um como outro, tinham sua amizade, mas o mesmo não o deixava explicar, e ainda acabou gritando algumas palavras ofensivas, ao que meu pai que estava com uma cesta de bambú na mão, deu-lhe um empurrão, usando a cesta, e derrubou o velho dentro de uma vala que tinha sido aberta para instalação de rede de água ou esgoto.

Dias depois meu pai recebeu uma intimação para comparecer à Delegacia de Polícia de Vila Raffard. Ao chegar lá foi atendido pelo delegado Américo Chiarini que foi logo perguntando: – Sr. Carmelindo, o sr. confirma que bateu num senhor que tem o dobro da sua idade? E que no momento da agressão o senhor estava armado com garrucha e revolver? Meu pai, um pouco nervoso, mas consciente de que as acusações eram falsas, disse: – Olha, senhor delegado, eu não bati nele não, até porque ele tem o dobro da minha idade, e eu tenho o dobro do tamanho dele, e se eu o agredisse seria até uma covardia.

E quanto à acusação de que eu estava armado, realmente, eu estava com uma cesta, na qual tinha várias garruchinhas e revolvinhos feitos de doce que eu mesmo faço para vender, como é do conhecimento de toda a Vila.

Assim o delegado dispensou meu pai, não sem antes, dar uma advertência para evitar de encontrar o senhor Rodrigues da Silva novamente.

Muitos da “velha guarda” daqui de Rafard, que nessa época eram crianças, lembram dos doces que meus pais faziam para vender, e confirmam que realmente eram réplicas de armas feitas de doce caramelizado. Se alguém duvidar, pergunte para o Vado Boscolo que ele não vai me deixar mentir sozinho.

Abraços aos meus caros amigos de sempre, e me perdoem que este mal, ou este costume de contar essas coisas, começa na mocidade, cresce na madureza e atinge o maior grau na velhice, pois os sonhos do acordado são como os outros sonhos, tecem-se pelo desenho das nossas inclinações e das nossas recordações…logotipo do fundo do báu raffard

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