Leondenis Vendramim

500 anos da Reforma Protestante – 11

02/04/2018

500 anos da Reforma Protestante – 11

Leondenis Vendramim é professor de Filosofia, Ética e História (Foto: Arquivo pessoal)
Leondenis Vendramim é professor de Filosofia, Ética e História (Foto: Arquivo pessoal)

ARTIGO | Antes de tudo é bom que se diga que alguns protestantes, egressos do catolicismo, eram também intolerantes. Lutero tinha uma teologia antijudaica; João Calvino, embora defendido pelos historiadores calvinistas e presbiterianos, parece ter sido um ditador espiritual e na sua gestão pelo menos um homem (fugitivo da Inquisição católica) foi sentenciado. O papado, e demais líderes eram acusados de imoralidades, adoção de doutrinas paganizadas, de enriquecimento ilícito e outras irregularidades por líderes do próprio catolicismo. Na falta de argumentos lançaram mão da força para silenciar seus denunciadores. Em 1095 Urbano II convocou nobres europeus para uma “Guerra Santa” contra albigenses, valdenses e outros. Em 1128 Honório II abençoou os cavaleiros templários para as cruzadas contra os orientais. No concílio de Tolouse 1229 o papado orientou que se criasse um tribunal eclesiástico em cada catedral composto por um sacerdote, e dois ou três leigos para julgar os hereges. Uma vez julgado, tiravam todos os bens do réu, seus familiares tinham de pagar as custas do tribunal, então os sentenciados confessavam sob torturas (veja artigo anterior) com seus ossos quebrados e juntas deslocadas, então eram queimados vivos em praça pública. “Faziam uma busca rigorosa a todos os hereges e seus cúmplices, vistoriavam cada casa, do sótão à adega, juntamente com todos os lugares subterrâneos, onde eles poderiam esconder-se” (Thomas M’Crie, History of the Reformation in Spain, 1856, p. 82). Era o tribunal mais temido no mundo. Os inquisidores vasculhavam sob tortura até o pensamento dos supostos hereges. À semelhança do nazismo tinham delatores em todos os lugares, até entre os familiares mais íntimos: cônjuge, filhos, parentes… “Tomás de Aquino dizia: “Existe o pecado pelo qual merecem não só serem separados da Igreja pela excomunhão, mas também serem retirados do mundo pela morte… os hereges que retornam sempre são … conservados na posse da vida e de outros bens temporais, isto pode ser prejudicial…” “Mas se depois de terem sido recebidos de novo decaem… são admitidos à penitência… mas não são libertados da pena de morte” (Bettenson, Documentos da Igreja Cristã, 182). Os dissidentes eram sempre acusados como causadores de catástrofes, pestes, misérias. Os clérigos condenavam e geralmente, os civis deviam executar.

Em 1542 Paulo III reorganizou e oficializou o tribunal para Congregação para a Doutrina da Fé, em 1904 mudou o nome para “Suprema Sagrada Congregação do Santo Ofício” e em 1965 recebeu o nome de Congregação para a Doutrina da Fé. É a mais antiga das nove congregações da Cúria Romana. O Papa Francisco nomeou recém Luis Francisco Ladaria Ferrrer como Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, substituindo o Cardeal Gerhard Muller que terá de responder a inquérito por abuso sexual na Austrália. Gregório IX confiou esses tribunais aos dominicanos e enviou os inquisidores a vários países europeus em cooperação com o bispo local. Ao chegar ao local faziam procissão com todo aparato, roupas vistosas, bandeirolas, tambores rufando, catracas barulhentas, realizavam missa na igreja e convocavam o povo a delatar. Ante a promessa de ir ao Céu, sem passar pelo purgatório, e devido ao medo de serem considerados hereges muitos delatavam até falsamente. No ano de 1209, em Beziers (França), 60 mil foram martirizados; dois anos depois, em Lauvau (França), o governador foi enforcado, sua mulher apedrejada e 400 pessoas queimadas vivas. A carnificina se espalhou por outras cidades e milhares foram mortos. Conta-se que num só dia 100.000 hereges foram vitimados. Depois de acusados, os hereges tinham pouca chance de sobrevivência. Geralmente as vítimas nem conheciam seus acusadores, que podiam ser homens, mulheres ou crianças, ou até criminosos. Defendia um inquisidor: “O herege esconde o seu desvio, e se torna difícil de descobrir, porque escondido no íntimo da pessoa, portanto é imperioso obter a confissão extorquindo-lhe pela força para corrigi-lo e impedir a disseminação do mal, e se possível, eliminá-lo para o bem do povo”.

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Jornal O Semanário

Esta notícia foi publicada por um dos redatores do jornal O Semanário, não significa que foi escrita por um deles, em alguns dos casos, foi apenas editada.

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