Naquela madrugada fria, aquele homem passava pela mata cerrada
como sempre fazia.
Montado em seu cavalo, com a cerração nada se via.
Mas aquela árvore
nem a cerração escondia.
Uma obra da natureza que com os anos crescia.
Seu tronco gigante, quem olhava se perguntava:
quantos anos deve ter?
Ninguém sabia!
Aquele homem desce de seu cavalo, ajeita o chapéu, cigarro no canto da boca, na cinta trazia seu facão.
Chega bem perto da árvore, vai acariciando com as mãos.
Seus olhos acompanham sua altura, começando do chão.
O pescoço chega a doer olhando a beleza da copa que se perde na imensidão.
Foi então que pensou
e tão longe seu pensamento foi:
Com esta árvore farei um belo carro de boi.
E seguiu sua viagem, mas da sua cabeça seus planos não saíram.
Depois de alguns dias, voltou com seus amigos e camaradas.
Foram tantas machadadas, e a gigante árvore caiu no chão, tombada.
Mas foi com carinho desgalhada.
A cada pedaço que cortava, aquele homem imaginava.
Já sabia de que parte seria.
Até as rodas de seu carro de boi!
Como um artista que nem ele sabia que era
por muito tempo trabalhou.
E o carro de boi ficou pronto do jeito que ele imaginou.
Aquela grande árvore, que por tantos anos esteve de pé, num lindo carro de boi se transformou.
E assim, esse carro, os bois puxaram pelas estradas sem fim.
Daquela árvore tão dura, que com o peso, madeira com madeira se esfregavam e até choravam. Cantavam!
De longe se escutavam os gemidos do carro de boi!
Se para uns foram gemidos tristes, para quem o criou era gemido alegre que ecoava no sertão.
O carro de boi, com o passar dos anos, foi abandonado, e depois suas partes foram separadas, se perdendo campo a fora.
Ah, carro de boi!
Quantas histórias foram contadas!
E hoje só recordação!
Se eu pudesse juntar seus pedaços
e te ver de novo, velho carro de boi!
Mas hoje eu quase chorei
quando na fazenda eu entrei.
Encontrei sua roda na sala do patrão!
Uma de suas rodas, bem cuidada pela sinhá,
servindo de mesa num canto da sala, bem em frente ao sofá.
Subi a escada, mas eu queria ficar admirando aquela forte madeira, tão dura.
Eu comecei a arrepiar!
De volta para a sala, depois de conversar, ainda olhei de novo, e comecei a pensar:
Velho carro de boi, se sua roda pudesse me contar
quem foi que te fez…
Na minha imaginação, esta história começou a chegar.
Por tantos lugares que andou, olha onde eu fui te encontrar.
Que satisfação!
Na sala do meu patrão!
A roda do carro de boi, no final da história,
veio me contar a sua história, para ferir meu coração.