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Contos do Caipira: O elo da corrente

Há muito tempo, um pobre senhor escravo recebeu o maior castigo de sua vida. Foi maltratado por tão pouco, coitado. Trabalhador, de uma imensa bondade sem rancor, um preto de um coração tão belo. Daqueles que daria sua vida para salvar a vida de um irmão ou, até mesmo, do patrão.

Naquele dia, ele estava fazendo um cocho de madeira para encher de água ou comida para a criação quando o patrão o chamou:

– Venha aqui, preto!

Batendo o machado, entendeu que o patrão o chamava, e disse:

– Patrão, eu já vou! Só mais um pouco, sinhô.

Mas o patrão sabe-se lá o que entendeu como resposta. Talvez: “O senhor está louco” ou “Não posso parar agora”. Não sabemos.

Nesta hora, o patrão se transformou. Parecia uma fera. Naquele lugar onde o escravo estava trabalhando – não era longe da casa – havia um rancho com capim alto ao redor, um lugar abandonado.

O sinhô entrou naquele rancho, pegou uma corrente bem grossa e enroscou num palanque no meio daquele lugar sujo de mato e cacos de tijolos e telhas velhas, e amarrou o pobre preto, que não sabia nem porque estava sendo castigado.

Aquele preto implorava ao patrão maldoso que não fizesse aquilo com ele. Mas foi deixado ali, sem água e sem comida. Pobre escravo. Ninguém podia chegar perto dele, ou então seria castigado também.

Um dia e uma noite de sofrimento passou aquele homem. O sol queimava, o vento frio e a noite de terror, mas ao meio-dia do dia seguinte lá estava de joelhos aquele escravo inocente.

De repente, escutou um barulho ou um chiado que o preto já conhecia, e muito bem. Se apavorou ainda mais e começou a implorar a São Bento que o protegesse daquela cascavel traiçoeira.

Sua fé foi tão grande que foi atendido na hora em que a velha cascavel estava pronta para dar o bote. A corrente grossa e forte, um elo se quebrou e abriu, e o pobre escravo saltou não sabemos com que força, mas deu um pulo e, com a corrente, acertou a cobra que já estava em pé para atacá-lo.

Outros escravos ouviram o homem gritando:

– Valei-me, meu São Bento! Livra-me deste peçonhento!

Daquele dia em que o patrão soube nunca mais ousou em castigar o velho escravo.

Passaram-se mais de 100 anos, e uma família trabalhando, construindo uma horta naquele sol quente, a senhora, ao bater o enxadão, encontrou o elo aberto, já enferrujado, mas bem resistente.

Assim termina a história do elo da corrente. Estourada pela grande fé do escravo a São Bento.

Toninho Junqueira

Toninho Junqueira é locutor há mais de 40 anos, escritor e restaurador de cadeiras antigas e imagens sacras. Desde 2021, conduz sua própria rádio, a São Gonçalo, com 24 horas de programação sertaneja raiz. Fale com o autor por telefone ou WhatsApp: (19) 99147-8069.

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